INTRODUÇÃO
Como apontam Riegel, Staudt e Daroit (2012), apesar das melhorias que o progresso e o desenvolvimento trouxe à vida das pessoas, é inegável o surgimento de alguns problemas como o crescimento populacional, maior consumo e consequentemente maior geração de resíduos sólidos, pressão no uso de recursos naturais, dentre outros. Nesse sentido, Espindola, Silva e Muller (2019) afirmam que no século XXI expandiu-se o culto ao corpo e à beleza, tornando maior a preocupação com padrões impostos pela sociedade no geral, incentivando o uso de cosméticos e produtos de tratamento de beleza, em que preocupar-se com a aparência não é um luxo e sim uma necessidade.
Com isso, a indústria de higiene pessoal, perfumaria e cosméticos (HPPC) tornou-se de extrema relevância na atualidade, uma vez que fornece produtos considerados essenciais às pessoas. Essa indústria é formada por três segmentos principais, como o próprio nome diz, sendo então os cosméticos, os produtos de higiene pessoal e os produtos de perfumaria, atribuindo uma heterogeneidade muito grande à indústria além de uma possibilidade de diversos posicionamentos corporativos a nível empresarial às empresas. É considerada como um dos segmentos da indústria química visto que utiliza e sintetiza ingredientes relacionando-se com a indústria farmacêutica para desenvolvimento e pesquisa de princípios ativos, além de fitoterápicos ou medicamentos originados de material botânico e de seus extratos (VERLY, 2020).
Como apresentado por CETESB (2005), devido a essa diversidade na área, no setor observam-se a presença de grandes empresas tanto nacionais quanto internacionais, especializadas ou não em determinados produtos. Além disso, outra característica relevante observada na área, como destaca o BNDES (2007), é a constante necessidade de inovação de produtos e grande investimento anual em lançamentos e promoções, já que é sempre fundamental as novidades no ramo. Nesse cenário, o Brasil encontra-se em uma ótima posição no cenário internacional, tratando-se de volumes de vendas, ocupando a 4° posição (Tabela 1), na qual na região sudeste é concentrada a maior prestação de serviços na área.
Tabela 1 - Mercado Mundial de Cosméticos em 2005.
Fonte: BNDES; 2007.
Por fim, entende-se que o setor de HPPC apresenta uma estreita relação com outros setores de produção, e, por ter uma preocupação constante com a apresentação de seus produtos, uma das principais indústrias destacadas são as das embalagens, sejam elas de papelão, plástico ou vidro (BNDES, 2007).
ASPECTOS RELEVANTES DA PRODUÇÃO
Inicialmente, é importante destacar três aspectos de suma importância da produção de cosméticos no geral, sendo eles: baixo consumo de energia, grande consumo de água e produção por batelada. Como a maioria dos processos na cadeia produtiva é realizado à temperatura ambiente, e a máxima temperatura atingida é de 80° C já que a maior parte da matéria prima se degrada quando exposta a temperatura superior, o consumo de energia na indústria acaba sendo baixo. Além disso, a água é muitas vezes incorporada ao próprio produto ou utilizada em alguma etapa produtiva, fazendo com que seu consumo seja maior quando comparado a outras indústrias. Por fim, a produção é caracterizada por um processo descontínuo, principalmente devido à diversidade de produtos e para suprir demandas do mercado, classificado como produção por batelada (CETESB, 2005).
As principais etapas para a produção de cosméticos nas indústrias pode ser dividida em 8 partes principais: recebimento de matérias primas, armazenagem, pesagem e separação de matérias primas, produção, análises, envase/embalagem, armazenamento de produtos acabados e expedição (Fluxograma 1). Devido a grande diversidade de produtos, a parte da produção é a mais variada dentre essas etapas principais, porém é perceptível o uso de misturados e homogeneização, já que são produtos em que são adicionados vários insumos químicos (CETESB, 2005).
Fluxograma 1 - Etapas gerais da produção de HPPC.
Fonte: CETESB; 2005.
PRINCIPAIS RESÍDUOS ORIUNDOS DA INDÚSTRIA COSMÉTICOS
A crescente participação das mulheres no mercado de trabalho é responsável pelo acelerado desenvolvimento do setor, acrescido do aumento da renda, da longevidade e da qualidade de vida da população como um todo, o que leva a uma maior preocupação com a aparência. Somam-se a esses fatores o aumento da produtividade do setor, os lançamentos constantes de novos produtos para atender às necessidades do mercado, o aperfeiçoamento das embalagens e a divulgação publicitária (ABIHPEC1, 2015).
Tendo em vista o crescimento considerável do setor de cosméticos, é notório o também crescimento de resíduos oriundos desse setor. Dentre eles, analisando todo o ciclo de vida de cada produto de higiene pessoal, perfumaria e cosméticos, desde o início da produção até o fim da sua vida útil, podemos citar como principais: a água usada no processo de produção e, para limpeza e resfriamento de maquinários, os óleos, amoníacos, cremes, sabões, pomadas vencidas e restos de embalagens (resíduos de plásticos e papelão).
GESTÃO ATUAL
Segundo o Conselho Nacional do Meio Ambiente (CONAMA), artigo 1° da Resolução 001, de 23 de janeiro de 1986, impacto ambiental é “qualquer alteração das propriedades físicas, químicas e biológicas do meio ambiente, causada por qualquer forma de matéria ou energia resultante das atividades humanas (...)”. Os impactos provenientes do setor de cosméticos são os mais diversos, desde a extração de matéria prima até os descartes de resíduos na natureza.
A gestão atual para tratamento dos resíduos produzidos pela indústria dos cosméticos, segue a norma NBR 10004/2004 da ABNT, que os classificam e abordam os procedimentos adequados quanto ao acondicionamento, armazenamento e despejo. Porém, ainda existe falha quanto ao descarte de produtos vencidos. Muitas vezes, por não existir a coleta apropriada, o consumidor descarta o produto de forma aleatória e inadequada, o que pode vir a contaminar o solo e/ou a água. De acordo com a ANVISA, baseada na NBR 9191/2000 da ABNT, os resíduos devem ser acondicionados em sacos resistentes a rupturas para evitar qualquer vazamento.
As embalagens são as responsáveis por grande parte do volume de resíduos gerados por esse setor, podendo ser de materiais recicláveis ou não e por isso, quando depositadas de maneira inadequada no meio ambiente, também podem vir a causar sérios problemas. Tendo em vista essa situação, a gestão desse tipo de resíduo deve ser feita contando com a coleta seletiva e o acondicionamento adequado feito pelo consumidor final.
De acordo com Moreschi (2013), os resíduos sólidos provenientes de instituições de beleza, quando gerenciados de forma inadequada, representam um grande problema socioambiental, revelando-se necessária a formação de profissionais qualificados e com conhecimento da importância de manuseio destes produtos para que, desta forma, possa se formar cidadãos comprometidos com a sustentabilidade e com cuidados com a sua saúde e a do próximo.
PROBLEMAS ADVINDOS DO DESCARTE INADEQUADO
Os resíduos de embalagens são atualmente considerados um fluxo específico de resíduos, possuem uma legislação própria e juntamente com a Política Nacional de Resíduos Sólidos, instituída pela Lei nº 12.305, de 2 de agosto de 2010, que estabelece as responsabilidades e os princípios de gestão para o gerenciamento dos resíduos. (BRASIL. Constituição (2010). Institui A Política Nacional de Resíduos Sólidos; Altera A Lei no 9.605, de 12 de Fevereiro de 1998; e Dá Outras Providências).
A geração e descarte de resíduos provenientes das embalagens advindos da indústria dos cosméticos é um dos impactos mais significativos para o meio ambiente, em função da diversidade de seus produtos como, caixas de papel, papelão, frascos, sacos, rótulos, sacolas e afins que são utilizadas para acondicionamento dos produtos. A maioria desses diferentes tipos de embalagens podem ser reciclados mas grande parte não possuem essa destinação adequada (CETESB, 2005).
A disposição inadequada desses produtos, muitas vezes com restos do produto, pode causar sérios danos ambientais, tanto na contaminação do solo como das águas subterrâneas. Sendo que a grande maioria das embalagens são descartadas após serem usadas apenas uma vez e não seguem para reciclagem. Este volume de resíduos ajuda a superlotar os aterros e os Central de Tratamento de Resíduos Sólidos - CTRs, e isso, quando os resíduos seguem mesmo para o depósito de lixo e para os oceanos.
Em 2018, foi descoberta uma enorme quantidade de lixo boiando no meio do Oceano Pacífico, estima-se que essa grande porção de lixo foi estimada ao equivalente a três vezes o território da França (Figura 1). Esse depósito de resíduos se formou com o lixo jogado por barcos, plataformas petrolíferas e vindos dos continentes, sendo reunido devido às correntes marítimas. Acredita-se que lá exista algo em torno de 100 milhões de toneladas de lixo. Sendo estimado que resíduos de embalagens provoquem anualmente a morte de mais de um milhão de aves e de outros 100 mil mamíferos marinhos (BARBOSA, 2018).
Figura 1 - Resíduo acumulado no Oceano Pacífico.
Fonte: Barbosa; 2018.
As embalagens cosméticas são feitas principalmente por plásticos, que são fabricados através de materiais poliméricos, no qual possui um custo benefício favorável. Entretanto, o acúmulo deste tipo de resíduo no meio ambiente ocasiona grande problema, pois é de difícil decomposição.
A indústria de cosméticos está entre as atividades que mais gera uma grande variedade de resíduos plásticos e com o descarte inadequado está ocasionando cada vez mais impactos ambientais, seja acarretando o lixo para os oceanos, superlotando os aterros, aumentando a ocorrência de enchentes e contaminando o solo e água.
Nesse contexto, é necessário criar formas de melhorar a gestão dos resíduos e de responsabilizar os indivíduos que fazem parte do ciclo que vai desde a fabricação de um produto até a sua destinação adequada, como uma das saídas a serem seguidas para os danos ambientais decorrentes da destinação inadequada de resíduos sólidos. (DIAS; MORAES FILHO, 2015, p. 30).
SOLUÇÕES PARA DESTINAÇÃO
A gestão de resíduos sólidos precisa ser trabalhada de uma forma que não gere impactos ambientais, segundo a Lei nº 12.305 de 02 de agosto de 2010, que instituiu a Política Nacional de Resíduos Sólidos no Brasil, os planos de gerenciamento devem atender tanto os aspectos sanitários e econômicos, quanto os aspectos ambientais e sociais. A solução para a destinação correta de resíduos originados da indústria cosmética vem por parte das empresas, realizando uma logística reversa, como também do governo fomentando a reciclagem e coleta seletiva e da própria população em fazer o descarte de seus resíduos de forma adequada. (BRASIL. Constituição (2010). Institui A Política Nacional de Resíduos Sólidos; Altera A Lei no 9.605, de 12 de Fevereiro de 1998; e Dá Outras Providências).
É necessário que todos os envolvidos na produção de resíduos e seu consumo sejam responsabilizados, e que as indústrias cosméticas se comprometam com a implantação de uma logística reversa de reaproveitamento de suas embalagens e de produtos vencidos. As empresas de cosméticos para minimizar esse descarte de resíduos seria de grande importância criar um sistema de recolhimento das embalagens.
Um exemplo dessa prática é a Avon, que criou um programa para coletar embalagens e resíduos de maquiagem e esmaltes de qualquer marca. Com essa atitude a organização se compromete a ajudar na sustentabilidade e na logística reversa (VG RESÍDUOS LTDA, 2020).
A logística reversa nada mais é que a reciclagem de produtos e seus resíduos após o consumo do cliente final e que deve ser implementada pelas indústrias, como regulamenta a Lei 12.305/2010 Política Nacional de Resíduos Sólidos.
Os produtos que não vão para a logística reversa devem seguir a forma mais adequada de descarte, que seria ser disponibilizá-los para a reciclagem. A reciclagem de resíduos de cosméticos possui alguns componentes que podem ser aproveitados dentro de uma cadeia produtiva, gerando economia de matérias-primas e diminuindo a retirada de recursos naturais. Sendo assim, reciclar resíduos de cosméticos é uma alternativa ambientalmente correta, a reciclagem tem grande importância para diminuir a quantidade de resíduos dispostos no meio ambiente e seus impactos.
O descarte de embalagens e outros produtos cosméticos é motivado por determinados fatores: obter um produto novo, consumo, finalização da mercadoria ou mesmo por ter se tornado antigo ou está fora do seu prazo de validade. É extremamente necessário que sejam realizados o manejo dos resíduos químicos, os quais podem ser danosos à saúde, à segurança e ao meio ambiente, uma vez que o descarte adequado visa prevenir e evitar riscos de contaminação (ESPINDOLA; SILVA; MULLER, 2019).
A reciclagem deve ser fomentada pelo governo através de um efetivo Plano de Gestão de Resíduos Sólidos, com a coleta seletiva e seguindo os resíduos que são recicláveis para uma usina de reciclagem. Sendo assim, há um dos grandes desafios para os órgãos públicos em concretizar a gestão e o gerenciamento dos resíduos sólidos urbanos, e organizar a coleta seletiva, o transporte e disposição final desses resíduos.
Curiosidades:
Os cosméticos líquidos, produtos como o xampu e o condicionador podem ser descartados normalmente nos ralos e privadas de casa; os esmaltes, tanto os esmaltes quanto os removedores é aconselhável verificar com os fabricantes onde descartar-se esse tipo de produto na sua cidade; produtos sólidos e pastosos, como maquiagens e cremes devem ser jogados no lixo comum e são direcionados normalmente aos aterros sanitários; as embalagens, podem ser destinadas à coleta seletiva ou em usinas de materiais recicláveis (KALIL, 2018).
Vidros e Metais, podem ser reciclados muitas vezes sem perderem suas propriedades físico-químicas. A garrafa de vidro pode ser retornada no processo cerca de 30 vezes, passando apenas por um processo de limpeza. As fibras que constituem o papel e o papelão perdem suas características físico-químicas durante os vários processos de reciclagem, ou seja, chega um momento em que a qualidade desse material não é mais adequada para a reciclagem, sendo necessário incentivar a redução de sua geração e consumo. Já os plásticos são compostos por moléculas orgânicas poliméricas, unidades de matéria muito longas nas quais uma pequena unidade estrutural repete-se inúmeras vezes (RESÍDUO ALL, 2017).
REFERÊNCIAS:
ASSOCIAÇÃO BRASILEIRA DE NORMAS TÉCNICAS. NBR 10004: Resíduos sólidos – Classificação. Rio de Janeiro, 2004.
ASSOCIAÇÃO BRASILEIRA DE NORMAS TÉCNICAS. NBR 9191: Sacos plásticos para acondicionamento de lixo - Requisitos e métodos de ensaio. Rio de Janeiro, 2000.
BRASIL. Constituição (2010). Institui A Política Nacional de Resíduos Sólidos; Altera A Lei no 9.605, de 12 de Fevereiro de 1998; e Dá Outras Providências.
BARBOSA, Vanessa. Ilha de plástico no Pacífico já tem quase três vezes o tamanho da França. 2018. Disponível em: https://exame.com/ciencia/ilha-de-plastico-no-pacificotem-quase-tres-vezes-o-tamanho-da-franca/. Acesso em: 07 set. 2021.
BNDES Setorial. Panorama da indústria de higiene pessoal, perfumaria e cosméticos. Rio de Janeiro, v. 1, n. 25, p. 131-156, mar. 2007.
CETESB, Companhia Ambiental do Estado de São Paulo. Guia Técnico Ambiental da Indústria de Higiene Pessoal, Perfumaria e Cosméticos. São Paulo: Cetesb, 2005.
CONSELHO NACIONAL DO MEIO AMBIENTE. RESOLUÇÃO CONAMA N° 1: 1986.
ESPINDOLA, Eduarda Silveira; SILVA, Lícia Albino da; MÜLLER, Simony Davet. CONSUMO E DESCARTE DE EMBALAGENS COSMÉTICAS: UMA VISÃO DA PRESERVAÇÃO AMBIENTAL PELOS ACADÊMICOS DO CURSO SUPERIOR TECNOLOGIA EM COSMETOLOGIA E ESTÉTICA. Santa Catarina, 2019.
KALIL, Chic Gloria. COMO DESCARTAR COSMÉTICOS DE FORMA CORRETA. 2018. Disponível em: https://www.reciclasampa.com.br/artigo/como-descartar-cosmeticosde-forma-correta. Acesso em: 07 set. 2021.
PIETRO, Gabriel. ONG faz história ao começar limpeza da “Grande Ilha de Lixo do Pacífico”. 2019. Disponível em: https://razoesparaacreditar.com/ilha-de-lixo-limpezaoceano/. Acesso em: 07 set. 2021.
RIEGEL, Izabel Cristina; STAUDT, Daiana; DAROIT, Doriana. Identificação de aspectos ambientais relacionados à produção de embalagens de perfumaria – contribuição para projetos sustentáveis. Gestão e Produção, São Carlos, v. 19, n. 3, p. 633-645, jun. 2012.
SOUZA, Priscila de Oliveira et al. RESÍDUOS SÓLIDOS DECORRENTES DA INDÚSTRIA DA BELEZA. Semioses: Inovação, Desenvolvimento e Sustentabilidade, Rio de Janeiro, v. 13, n. 2, p. 113-127, jun. 2019.
VAIANO, Bruno. A grande ilha de lixo do Pacífico não é o que você imagina. 2018. Disponível em: https://super.abril.com.br/ciencia/the-great-pacific-garbage-patch-isntwhat-you-think-it-is/. Acesso em: 07 set. 2021.
VERLY, Nathalie Rocha. Estratégias Empresariais de Bioeconomia e Economia Circular na Indústria de Cosméticos. 2020. 69 f. Monografia (Especialização) - Curso de Química Industrial, Universidade Federal do Rio de Janeiro, Rio de Janeiro, 2020.
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