INTRODUÇÃO
A partir do século XX, os centros urbanos (principalmente de países subdesenvolvidos) vivenciaram uma marcante explosão demográfica . De acordo com dados de 2016 fornecidos pelo IBGE (Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística), de 2005 a 2015, a porcentagem da população brasileira vivendo no ambiente urbano aumentou de 82% para 84%.
TUCCI (2010) aponta que o processo de urbanização vem ocorrendo de forma desordenada em todo o mundo mesmo com a existência dos Planos Diretores , assim gerando impactos significativos no meio ambiente que está ocupado, como por exemplo: uma contribuição em grandes proporções para as cheias que ano após ano vêm atingindo as cidades brasileiras, como também para a piora da qualidade das águas dos corpos hídricos.
De acordo com GONÇALVES (2017), a transição do ambiente rural para o urbano ocorre de maneira a não se respeitar os sistemas naturais das águas, assim alterando todo o seu ciclo hidrológico. É do nosso conhecimento que a pavimentação e a compactação do solo criam uma barreira que dificulta a infiltração das águas pluviais no solo das cidades, assim ocasionando um desequilíbrio do balanço hídrico. Como consequência, nota-se um aumento excessivo do escoamento superficial devido à redução de infiltração das águas pluviais.
Esse aumento excessivo do escoamento superficial resulta em um maior volume de água decorrente de enxurradas e cheias urbanas, que pode ser associado a diversos fatores, tais como: um mal planejamento urbano e como consequência o mau uso do solo, pelas ocupações de áreas de risco, ineficiência e/ou falta de manutenção dos sistemas públicos de drenagem e falhas no processo de coleta e disposição de lixo, entre outros. Essas ocorrências, por sua vez, geram riscos à saúde pública e prejuízos socioeconômicos que são distribuídos ao longo de toda a sociedade. Além disso, as cheias urbanas ocasionam a degradação ambiental dos cursos d'água devido ao recebimento de efluente de águas pluviais que lavam as cidades, carregando os mais diversos tipos de contaminantes.
Ressalta-se que o escoamento superficial, sob condições de permeabilidade do solo próximas à permeabilidade natural, também é importante para o restabelecimento do ciclo hidrológico.
Nesse contexto, os sistemas de drenagem urbana visam controlar os possíveis impactos causados pela impermeabilização do solo, tais como o aumento da vazão e a ocorrência das cheias urbanas. Portanto, tem-se que a drenagem urbana diz respeito às medidas de infraestrutura responsáveis por captar e conduzir as águas das chuvas nas cidades.
Para tanto, uma das soluções que pode ser adotada consiste na introdução de sistemas de drenagem na fonte que visam restabelecer o equilíbrio do balanço hídrico na área a ser ocupada por meio da indução da infiltração da água pluvial, além da redução e da retenção do escoamento superficial.
Ao contrário das técnicas convencionais que centralizam o escoamento superficial transportando-o para um ponto à jusante e criando sistemas cada vez mais extensos de galerias pluviais, os sistemas de drenagem na fonte atuam diretamente na origem do problema, controlando o excesso de escoamento superficial no local onde é gerado.
Um sistema de infiltração pode ser composto por diversos componentes de drenagem, auxiliando tanto na redução das taxas de escoamento superficial, quanto no aumento da recarga das águas subterrâneas. Ademais, pode-se ter uma combinação de diferentes sistemas, como poços, trincheiras e bacias de infiltração, que consistem em canais e zonas nas quais ocorre o escoamento ou o armazenamento de água pluvial. Vale ressaltar, ainda, que a taxa de infiltração por tais sistemas depende da permeabilidade do solo no local.
Entre as soluções alternativas de drenagem na fonte, os poços de infiltração e trincheiras constituem sistemas de grande potencial quanto à redução do volume de escoamento superficial e tratamento da água infiltrada.
POÇOS DE INFILTRAÇÃO
De acordo com CASTRO (2002) os poços de infiltração são utilizados na França, desde meados do século XVIII, além de outros países: Alemanha, Inglaterra, Estados Unidos, Itália, Austrália e Japão. No Brasil, temos o exemplo do município de Lassance MG, cuja iniciativa da implantação dessa medida rendeu prêmios como o Prêmio ANA 2012.
Os poços de infiltração são estruturas pontuais que permitem o amortecimento de picos de vazão que possam atingir o sistema convencional de drenagem, diminuindo o volume do escoamento superficial e reduzindo assim a probabilidade de inundações a jusante no sistema de drenagem. São uma solução sustentável pois estabelecem pontos de recarga do lençol freático e mantém o balanço hídrico natural, além de melhorar a qualidade da água. São apropriados em locais em que a camada superficial do solo é pouco permeável, mas com capacidade de infiltração significativa em camadas mais profundas, segundo BAPTISTA, NASCIMENTO & BARRAUD (2005).
Os poços, que permitem o armazenamento temporário da água pluvial, têm custo considerado baixo para sua construção, e podem conter ou não material de preenchimento. No caso de um poço de infiltração preenchido, o sistema consiste em um poço escavado no solo, revestido por tubos de concreto perfurados ou tijolos assentados em crivo, envoltos por uma manta geotêxtil fazendo a interface solo/tubo, e fundo revestido por uma camada de agregados graúdos, também envolta por geotêxtil, de forma a permitir a infiltração para o solo do volume de água pluvial escoado para o seu interior, de acordo com REIS et. al. Veja o esquema na figura abaixo:
Fonte: REIS et. al. (2005)
Os poços preenchidos contém em seu leito materiais porosos, como areia, brita e cascalho, conforme ilustra o esquema abaixo:
Fonte: SOBRINHA (2012)
REIS (2008) explica que nesse sistema de drenagem na fonte, é feita a captação de toda água de chuva advinda da edificação e somente após a saturação do solo o poço se enche e então passa a ser lançada no sistema de drenagem pública, através do extravasor. Veja o esquema abaixo que mostra a disposição do poço anexado a um edifício:
Fonte: REIS et. al. (2008)
Sua estrutura ocupa uma pequena área superficial e são bem discretos, o que o torna de fácil integração ao ambiente urbano, podendo até mesmo ser utilizados harmoniosamente no paisagismo da área, como demonstra a figura a seguir, um exemplo da implantação de poço de infiltração em área de lazer em Lyon, França.
Fonte: REIS et. al. (2008)
Apesar de suas vantagens, alguns pontos negativos devem ser observados, como a baixa capacidade de armazenamento de água (mas também pode ser usado como complemento para um outro sistema de drenagem); possui restrições de eficiência em áreas com declividade; necessita de manutenção periódica para controle de colmatação; e oferece risco de contaminação das águas subterrâneas. Além disso, não podem ser instalados em terrenos com solos colapsíveis, em solos com baixa capacidade de infiltração ou local com nível lençol freático elevado.
TRINCHEIRAS DE INFILTRAÇÃO
As trincheiras de infiltração têm por função o armazenamento temporário das águas pluviais e subsequente infiltração desta no solo, com isso, ocorre a diminuição do escoamento superficial e a recarga de água subterrânea. Elas são sistemas de infiltração lineares, ou seja, possuem comprimento superior a largura e profundidade, além de poderem apresentar vários formatos e se integrarem facilmente ao ambiente.
Esses sistemas são basicamente áreas escavadas, ou valetas, que são preenchidas por material granular como brita e seixos rolados, deve haver também uma camada de manta geotêxtil a fim de evitar a passagem de partículas finas e que podem gerar colmatação. Esse tipo de estrutura, segundo Schuele (1987) apresenta grande eficiência na remoção de partículas solúveis e poluentes, entretanto o sistema não se destina a prender sedimentos maiores. A figura a seguir apresenta um esquema de trincheira de infiltração:
Fonte: adaptado de SCHUELER (1987)
Em relação ao funcionamento da estrutura, o acesso das águas superficiais pode se dar por meio da superfície, ou por meio de um sistema de drenagem, que efetua a coleta e sua introdução a trincheira, já a saída da água se dá pela infiltração no solo (TOMINAGA, 2013). A figura a seguir apresenta uma trincheira de infiltração com um sistema de drenagem para direcionar o escoamento superficial, sendo ele uma caixa de entrada com um vertedor triangular, ligada através de um dreno ao interior da trincheira.
Fonte: MELO et. al. (2016)
A implantação de uma trincheira de infiltração requer análises prévias sobre os aspectos urbanos de uso e ocupação, de infraestrutura existente, topográficos, hidrogeológicos, entre outros. Vários fatores podem limitar a implementação desse sistema, entre eles: a instalação em áreas aterradas; a inclinação do terreno, devendo ser inferior a 5%, declividades mais acentuadas podem causar maior velocidade de escoamento superficial e então menor captura de volume de água; tipo de solo, há preferência para solos com presença de areia e baixo teor de silte e argila, proporcionado maior infiltração; a distância do lençol freático, visto podem ocorrer contaminações; entre outros.
Em relação a outros sistemas, as trincheiras de infiltração apresentam algumas vantagens, como a facilidade de integração visual com a paisagem; permitir que o espaço seja utilizado para outras atividades; boa adaptação ao sistema viário, em geral requerendo pouco ou nenhum espaço suplementar. Apesar de não necessitarem de manutenções frequentes, eventualmente há a necessidade de manutenção devido a colmatação na base das trincheiras, esta é de difícil realização por se tratar de uma estrutura que possui uma camada de material granular sobre sua base. No caso de abandono da trincheira e passado muito tempo, ainda há a vantagem de ela estar funcionando, mesmo em menor proporção.
As imagens a seguir mostram duas trincheiras, a primeira localizada em North Kingstown, Rhode Island; e a segunda referente ao experimento instalado em área do campus da UFMG:
Fonte: http://dem.ri.gov/ri-stormwater-solutions/
Fonte: PROSAB
REFERÊNCIAS:
ALMEIDA, Isis de Castro. Sistemas sustentáveis de drenagem urbana: uma proposta para a bacia hidrográfica do córrego São Pedro, em Juiz de Fora – MG. Juiz de Fora, 2020.
MELO, T. DOS A. T. de; COUTINHO, A. P.; SANTOS, J. B. F. dos; CABRAL, J. J. da S. P. ANTONINO, A. C. D.; LASSABATERE, L. Trincheira de infiltração como técnica compensatória no manejo das águas pluviais urbanas. Porto Alegre, 2016.
REIS, R. P. A.; OLIVEIRA, L. H.; SALES, M. M. Sistemas de drenagem na fonte por poços de infiltração de águas pluviais. Porto Alegre, 2008.
RIGHETTO, A. M. Manejo de Águas Pluviais Urbanas. Rio de Janeiro: ABES, 2009.
TOMINAGA, E. N. S. Urbanização e cheias: medidas de controle na fonte. São Paulo, 2013.
SOBRINHA L. A. Monitoramento e modelagem de um poço de infiltração de águas em escala real e com filtro na tampa. São Carlos, 2012.
SCHUELER, T. R., Controlling Urban Runoff: a practical manual for planning and designing urban BMSs. Washington: Metropolitan Concil of Governments, 1987.
SILVA F. R. Avaliação do poço de infiltração exigido pelo diretor de Aparecida de Goiânia em um lote residencial. Aparecida de Goiânia, 2019.
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